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Rei do asfalto: Dodge Dart é objeto de desejo dos colecionadores brasileiros


Equipado com um potente motor V8, o veículo marcou época e até hoje atrai uma legião de admiradores em todo o Brasil. Para saber mais sobre seus detalhes, desfrute dessa viagem no tempo na matéria

Por: Anderson Nunes - 11 de agosto de 2014

O visual invocado e cheio de cromados, características dos anos 70No início dos anos 60, a Chrysler Corporation colocou em prática um processo de expansão comercial que consistia em adquirir fábricas prontas, ao invés de investir em construções de novas unidades. Dessa forma, a Chrysler resolveu intensificar suas ações na Europa, território em que ela atuava de maneira mais restrita, ao contrário das suas compatriotas Ford e Chevrolet, que já tinham uma sólida história no velho continente.

Nessa nova política foi adquirida na Inglaterra o grupo Roots, fabricante dos modelos Hillman. Na Espanha, a marca do “pentastar” comprou a Barreiros e por fim na França a Simca. Essas aquisições possibilitaram a criação da Chrysler Europa. No Brasil a Chrysler aportou em 1966, ao comprar a Simca.

Vale salientar que a marca Chrysler, bem com suas divisões Dodge, DeSoto e Plymouth já tinham sido comercializadas em território nacional antes da Segunda Guerra Mundial. Já nas décadas de 1940 e 1950, os modelos do grupo Chrysler foram montados no Brasil, a partir de importação em regime CKD (kits de carros completamente desmontados) pela Brasmotor, empresa brasileira e pioneira na Logotipo Dodge ficou mais discreto no capômontagem de veículos importados no país. A Brasmotor foi responsável também pela montagem dos primeiros Volkswagen no Brasil.

Com o plano de metas do governo Juscelino Kubitschek para atrair fabricantes de carros ao país, a Brasmotor decidiu partir para a fabricação de eletrodomésticos da linha branca, com a marca Brastemp. Num primeiro momento a Chrysler não demonstrou interesse em fabricar seus carros por aqui. Entretanto com a compra da Simca, finalmente a companhia se instala no Brasil. Já em outubro de 1966, oficialmente a empresa francesa era absorvida pela Chrysler. A compra total das ações da Simca ocorreu em novembro de 1967, esse controle acionário mudou a razão social para Chrysler Do Brasil S.A.

Em abril de 1968, o governo brasileiro aprovara um investimento de 50,2 milhões de dólares, para a produção dos caminhões Dodge e o projeto de desenvolvimento do modelo Dart equipado com o motor V8. Para adequar os modelos ao clima e território tupiniquins a Chrysler trouxe dos Estados Unidos três Dodge Dart equipados com motor V8 de 5,2 litros com potência de 205 cv. Os carros eram testados exaustivamente na estrada velha de Santos e na Pedro Taques.

Maçanetas cromadas eram luxuosasNo interior da fábrica da Chrysler, em São Bernardo do Campo, entre a linha de montagem dos modelos Esplanada e Regente, um grande tapume de madeira escondia a linha de produção da qual sairiam os futuros Dart brasileiros. Em junho de 1969, os cinco primeiros protótipos feitos a martelo estavam finalizados. A imprensa já dava como certo o lançamento do Dart ainda no final daquele ano.

NASCE UM ÍCONE
Em 10 de setembro de 1969, era apresentado para a imprensa, no Guarujá, o Dodge Dart. Colocado à venda em outubro, o “nosso” Dart impressionava pela carroceria de linhas elegantes e imponentes, iguais ao modelo estadunidense lançado em 1967.

Além do visual chamava a atenção também o tamanho do motor V8 de 5.210 cm³, o famoso 318 pol³ alimentado por um carburador de corpo duplo DFV 446 com potência de 198 cv a 4.400 rpm e torque de 41,5 m.kfg a 2.400 rpm. Nos testes da revista Quatro Rodas, a publicação citava a força do V8 dizendo que ele tinha torque de sobra e encarava subidas como se estivesse no plano. Tinha como principais concorrentes o Ford Galaxie 500 e o Chevrolet Opala.

Luzes de seta na cor âmbarO Dodge Dart foi lançado inicialmente na versão sedã de quatro portas, que media 4,96 metros de comprimento e 2,82 metros de entre-eixos. Acomodava seis passageiros graças ao banco dianteiro inteiriço revestido de vinil, mas tinha o agravante de não oferecer regulagem do encosto.

 

A alavanca do câmbio de três marchas seguia a tradição da escola norte-americana e era posicionada na coluna de direção. Painel de instrumentos trazia velocímetro graduado até 200 km/h, indicador do nível de combustível, manômetro de óleo, termômetro de água, amperímetro e relógio, mas pecava por não oferecer o conta-giros. Um detalhe de requinte era o anel luminoso do interruptor de partida, que se acendia quando as portas eram abertas e apagava-se meio minuto após serem fechadas. O porta-malas tinha capacidade para levar 436 litros.

Em relação ao conterrâneo Ford Galaxie, o Dart diferenciava-se pela construção monobloco, ao invés do arcaico conjunto de carroceria fixada sobre um chassi perimetral. Uma novidade técnica era a suspensão dianteira independente que, ao invés de utilizar molas helicoidais, trazia braços triangulares sobrepostos ligados a um tirante elástico unido a uma barra de torção. Já a suspensão traseira era por eixo rígido com feixe de molas semielípticas. Os freios eram a tambor nas quatro rodas.

Dart de duas portas e sem coluna central inaugurou o termo “hardtop”, no Brasil

Tampa de combustível preta remetia à esportividadeUma curiosidade ficava por conta das porcas das rodas do lado esquerdo, que eram desatarraxadas no sentido horário. A informação presente no manual do proprietário falava apenas nas porcas, mas sem especificar qual o lado, já que no lado direito as porcas eram retiradas no modo convencional. Muitos donos quebraram a cabeça no início para descobrir tal operação.

Apesar de os primeiros carros chegarem às ruas com problemas de má vedação que permitiam a entrada de água e poeira, câmbio com problemas de engates e trepidação do capô em alta velocidade, o Dodge Dart assumiu a liderança de vendas no segmento de veículos de luxo ainda em 1970, com mais de 10 mil unidades vendidas ou 41% de participação de mercado. Foi eleito pela revista Auto Esporte com o prêmio “Carro do Ano”.  

Lanternas divididas em três partes com luz de ré ao centroCUPÊ, ESTILO JOVIAL 
No Salão do Automóvel de outubro de 1970, a Chrysler amplia a sua linha com o lançamento do Dart cupê, de duas portas. O modelo chamou a atenção do público devido ao seu aspecto esportivo. O teto, com suas colunas laterais traseiras inclinadas, e o vidro côncavo conferiam um ar mais jovial ao modelo. Esse estilo de carroceria inaugurou no Brasil o termo conhecido como “coupé hardtop”, sem coluna central. Apesar do tamanho das portas e do encosto do banco dianteiro ser rebatível o espaço para as pernas dos ocupantes traseiro era reduzido. 

O Dart cupê logo passou a ser o carro mais veloz do Brasil com velocidade máxima de 181 km/h e aceleração de 0 a 100 km/h em 11 segundos. Mas isso tinha influenciava no consumo, já que alcançava médias de 4 e 6 km/l com 1 litro de gasolina, num tempo em que o combustível custava pouco isso não tinha tanta importância. Só era necessário ficar de olho no ponteiro do marcador de gasolina para não ocorrer uma pane seca, pois o tanque comportava somente 62 litros. 

Para a linha 1971, a Chrysler trouxe aprimoramentos para a linha Dart com a opção da direção com o sistema de assistência hidráulica de redução 16:1, que exigia apenas três voltas e meia no batente do volante. Isso poupava o motorista no momento da baliza, já que a direção sem assistência hidráulica demandava quase o dobro de voltas, seis voltas e meia e redução de 24:1. Já os freios contavam agora com disco ventilado nas rodas dianteiras da marca Vargas, que propiciavam frenagens mais seguras e pneus cinturados Pirelli CF 67 que ajudavam na estabilidade.

Outra comodidade foi a introdução do câmbio automático de três marchas, batizado de Torqueflite, com sistema hidráulico por conversor de torque. A alavanca de marchas era na coluna de direção e tinha as indicações de posições de marchas: E-R-N-D-2-1; tinha como novidade o bloqueio do conversor de torque (lockup) para a terceira marcha, que melhorava o desempenho e reduzia o consumo de combustível.  Para o Dart sedã havia também a opção do ar-condicionado. Pequenas mudanças visuais e internas foram efetuadas para a linha 1972. Na dianteira o friso cromado horizontal, no meio da grade pintada em preto fosco, era mais largo. As luzes de setas passaram a ser na cor âmbar.

Diferencial de segurança era a luz repetidora de seta na lateral /  Iluminação interna também tinha moldura cromadaNo capô o logotipo “Dodge”, que antes era grafado em letras garrafais no centro, foi deslocado para o lado esquerdo. Já nas laterais foram pintados dois filetes finos, paralelos, branco ou preto, dependendo da cor da carroceria, que são interrompidos na traseira pelo logotipo “Dart de Luxo”.

Espaço e conforto interno eram realçados pelos bancos em couroNa traseira o destaque eram as novas lanternas, agora divididas em três partes: duas vermelhas na extremidade, e uma branca para a luz de ré. Na tampa do porta-malas há novo friso metálico, com a marca “Dodge” escrita em branco. As calotas também mudaram: eram de uma só peça, batizadas de supercalotas e que eram usadas até então apenas pelo Dart sedã. O sistema elétrico passou a contar com novos chicotes inteiriços no lugar do conjunto dividido em duas partes. A caixa de fusível foi mudada para o compartimento do motor próximo à parede de fogo, assim como a bobina.

No interior foram feitas modificações no painel e no sistema de ventilação. Os mostradores ganharam nova grafia e o fundo passou a ser branco para facilitar a leitura. O amperímetro e o manômetro de óleo foram substituídos por luzes-espia. E por fim o comando do sistema de ventilação foi simplificado: uma só alavanca reunia o controle de ventilador (opcional) de duas velocidades e o regulador de distribuição de ar. 

Sutis mudanças foram feitas na linha Dart em 1973. A dianteira ganhou nova grade em plástico dividida por um pequeno friso horizontal. O logotipo Dodge passou ser em manuscrito. A supercalota foi abandonada e os Dart voltaram a utilizar a calota pequena, agora de aço inox.

Motor V8 de 5.2 litros - garantia de alegria em cada aceleraçãoNo interior os comandos de ventilação e rádio ganharam novos desenhos. O câmbio passou a ter quatro marchas e era instalado no assoalho. Na parte mecânica o freio a disco dianteiro passou a ser de série. O ano de 1973 ficou registro com o maior volume de vendas da Chrysler, com 17.939 unidades comercializadas.

Alternador era novidade na época e merecia dicas ao reparador / Logotipos ficavam espalhados pelo veículoA crise do petróleo bate à porta e os preços dos combustíveis dispararam em 1974. Os motores V8 foram os principais afetados e a Chrysler começava a pesquisar formas para que seus motores se tornassem mais econômicos e menos poluentes. O Dart passou a oferecer como opcional ignição eletrônica, que eliminava o platinado e condensador, mantendo o motor regulado por mais tempo e oferecendo melhor desempenho. Como paliativo para conter o consumo, a linha Dodge passou a ofertar como opcional o Fuel Pacer System (algo como moderador de consumo combustível). O sistema acionava os repetidores de luzes de direção fixados no paralamas dianteiro, que orientavam o motorista a pisar pouco no pedal do acelerador. 

Para facilitar a leitura, mostradores com fundo brancoA Chrysler tentava contornar o problema na economia de combustível testando inclusive um motor de 4 cilindros em “V” derivado do 318. Foi também estudado a adesão do motor de 6 cilindros em linha do Valiant argentino, mas nenhum se mostrou capaz de substituir o robusto V8 de 5,2 litros.

Durante a crise do petróleo o governo baixou uma portaria em que os postos de gasolina fechavam das 20 horas às 6 horas nos dias úteis e completamente nos fins de semana. Para diminuir o problema a Chrysler ampliou a capacidade do tanque de combustível de 62 para 107 litros. 

FIM DE UMA ERA
Mudanças visuais foram feitas na linha 1979. O Dart exibia frente igual ao modelo norte-americano feito até o ano de 1976. A grade trazia um “bico” no centro.

Os parachoques eram os mesmo utilizados nos últimos Dart produzidos nos EUA. A traseira também passou por mudanças e vinha com lanternas horizontais bipartidas importadas dos modelos americanos.

A bateria passou de 50 ampères para 54 ampères-horas. O radiador foi aumentado e comportava 19 litros. Em maio de 1979 a transmissão automática passou a ser equipada com Lock Up, que possuía bloqueio do conversor de torque atuante na terceira marcha, resultando em melhor aceleração e diminuição no consumo de combustível

A linha Dart recebeu novas forrações e tecidos, podendo ser nas cores bege, azul ou preto. As manivelas de vidro, pinos de trava da porta, o espelho interno e o suporte dos puxadores das portas eram cinza. Os bancos foram revistos e os assentos ficaram mais altos. O rádio Motoradio AM/FM trazia toca fitas e antena elétrica.

Revestimento das portas em courvin e portas sem coluna / Painel com informações essenciais e alavanca de câmbio na coluna de direçãoAinda em 1979, a Volkswagen AG compra 67% das ações da Chrysler do Brasil. Em abril do mesmo ano, dirigentes da empresa alemã negam o fim da linha Dodge no Brasil e reiteram o interesse em fabricá-los e aumentar o número de revendas Chrysler de 117 para 180. Isso era só uma forma de ganhar tempo, pois a VW estava interessada na linha de caminhões Dodge, que ela utilizaria para adquirir conhecimento e lançar o primeiro caminhão VW do mundo.

Revestimento das portas em courvin e portas sem coluna / Painel com informações essenciais e alavanca de câmbio na coluna de direçãoO canto do cisne se deu em agosto de 1981 quando foi cessada de vez a produção dos veículos Dodge no Brasil. Somente os motores V8 continuaram em linha por um período para equipar os caminhões Volkswagen. O Dodge Dart foi o modelo de maior êxito comercial no Brasil, sendo produzido um total de 72.934 unidades. Passados mais de 30 anos desde que saíram de linha, os modelos Dodge equipados com motor V8 ainda hoje atraem uma legião de fãs pelo Brasil.

ADMIRADOR DOS DODGES
O empresário João Henrique S. T. Fusco, de 35 anos, é admirador de veículos antigos desde a infância. Seu pai e seus avós sempre gostaram de carros e o cuidado e zelo que eles tinham por cada modelo fizeram com que desde pequeno João aprendesse a apreciar e preservar os carros antigos.

O Dodge Dart faz parte da família Fusco desde 1986, foi quando seu pai adquiriu um Dart cupê 1978, que durante muito tempo foi o carro de uso. “Em 1986 meu pai comprou um Dodge Dart e fiquei impressionado com a potência e estilo daquele carro. Foi a partir desse Dart que a minha paixão pela marca Dodge começou”, explicou o empresário.

Pisca alerta e freio de mão ficavam abaixo do painel do lado do motorista   Em 2008, João Fusco realizou o sonho de ter seu Dodge Dart. Localizou na cidade de Caçapava, interior de São Paulo, um modelo cupê azul náutico 1972 com apenas 14.700 km rodados. O carro, que pertenceu a um comerciante, ficou guardado durante muito tempo na garagem protegido por uma capa. “Não foi necessário nenhum tipo de restauração, pois ele estava em perfeitas condições, sempre guardado com capa protetora e em garagem coberta. Apenas os pneus foram trocados, pois estavam muito ressecados”, disse Fusco.

 Um detalhe curioso é que veículo nunca usou a placa de licença amarela devido ao tempo em que foi guardado. Assim que foi adquirido usou por pouco tempo a placa cinza até obter a placa preta. Hoje o Dodge Dart cupê tem pouco mais de 20 mil km rodados. Ele conserva ainda os manuais, selos de manutenção e nota fiscal da concessionária Nova Texas, localizada na cidade do Rio de Janeiro. O Dart cupê foi faturado no dia 28 de janeiro de 1972, e custou Cr$ 30 mil.   Quanto à manutenção, João Fusco disse que não é um carro difícil de mexer na mecânica, embora muitas peças já estejam difíceis de achar. “Recentemente tive um pequeno acidente em um encontro de veículos antigos. Um rapaz deu ré e bateu na lanterna do lado esquerdo, foi um sufoco achar outra igual. Nos Estados Unidos é possível encontrar a mesma lanterna, mas ao invés de ser feita em acrílico, ela é feita em vidro”, salienta João.

Agradecimento: S.E Veículos, Taubaté.