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Esportivo brasileiro: o belo Volkswagen SP2 foi considerado “o senhor automóvel” nos anos 70


Projetado no Brasil, o veículo tinha estilo arrojado e foi destaque até no exterior, mas foi vítima do fraco desempenho que os motores boxer advindos dos Fuscas traziam ao veículo

Por: Anderson Nunes - 16 de setembro de 2014

Identidade familiar: assim como a Variant, o SP2 trazia dois pares de faróis envoltos por uma moldura plásticaNo início da década de 70, o Brasil passava por um momento único em sua história, vivíamos uma época de prosperidade econômica - o chamado milagre brasileiro. O tal “milagre econômico” possibilitou aos consumidores de classe média gastar mais e isso se refletiu nas vendas de automóveis.

Com o mercado automotivo em alta os fabricantes começaram a dedicar atenção por um novo segmento, até então pouco explorado no País: o dos carros-esporte. Inicialmente esse nicho fora preenchido pela Willys, com o Interlagos em 1961 e por fábricas independentes das quais a que ficou mais famosa foi a Puma, que dominou esse filão durante os anos 70.  A Volkswagen, que estava estabelecida no Brasil desde a década de 1950, produzindo a Kombi e o Fusca, também começou a olhar com bons olhos esse mercado de carros esportivos. Em parceria com a Karmann Ghia do Brasil, foi lançado em 1962 a versão tupiniquim do Karmann-Ghia, que diferenciava-se pouco do modelo alemão, sendo inclusive equipado com o mesmo motor 1200 de 30 cv.

Embora durante os anos seguintes a Volkswagen tenha feito melhorias contínuas no Karmann Ghia com a introdução de freios a disco nas rodas dianteiras e bitolas traseiras mais largas, e equipá-lo com motor 1500 de 44 cv e posteriormente com motor 1600 de 50 cv e torque de 10,8 m.kgf, nada disso teve reais impactos em suas vendas.

A situação ficou agravada quando a Puma apresentou em 1967 o Puma GT, que deixava de empregar componentes mecânicos do DKW e passava a utilizar chassi, suspensão e motor Volkswagen - o boxer refrigerado a ar de quatro cilindros e 1,5 litro.

A Volkswagen tentou fazer frente ao avanço do Puma, lançado em 1970, o Karmann Ghia TC. Com linhas mais modernas de estilo fastback, o TC tinha uma clara inspiração no Porsche 911. Embora seu valor fosse menor do que o Puma GTE, o TC não emplacou e permaneceu em linha até 1975, somando um total de vendas de 18 mil unidades.

 Logotipo do SP2 inspirava esportividade / Maçanetas cromadas se destacavamEntretanto a Volkswagen não estava disposta a entregar os pontos e ainda no final da década de 60 deu início aos estudos de verdadeiro carro GT. Tudo para encarar de igual para igual o Puma, que havia se tornado um sonho de consumo da garotada.

 Limpador de para-brisa esquerdo com braço pantográfico, uma exclusividade do SP2
COM AVAL DO CHEFE
A Volkswagen do Brasil desde seus primórdios sempre teve certa independência da matriz alemã, graças à presidência de Rudolf Leiding. Em 1969 com o aval de Leiding foi dado sinal verde para o Projeto X, que consistia no desenvolvimento de um carro esportivo totalmente novo, diferente de todos os modelos já feitos pela Volkswagen.

O time de engenheiros foi escalado e faziam parte da equipe José Vicente Novita Marins, Marcio Piancastelli e Jorge Yamashita Oba. Diversos estudos de estilos foram apresentados e já no começo de 1970, Leiding aprova os desenhos e na sequência autoriza a construção dos primeiros protótipos.

 SP2 é um carro esportivo de carroceria leve e diferente de todos os demais Volkswagen existentes

 Bocal do tanque remetia aos antigos veículos de corrida / Lanternas estreitas seguiam as formas arredondas da carroceria Em março de 1971, ocorreu no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, a Feira da Indústria Alemã. Entre as atrações que mais despertaram a curiosidade do público e da imprensa, estava o protótipo do Mercedes-Benz C-111, um superesportivo de cor laranja com motor rotativo Wankel. A indústria nacional também havia reservado boas surpresas. No estande da Volkswagen brilhavam duas versões de um modelo inédito. Eram os VW Esportivos, que só na metade do ano seguinte seriam lançados oficialmente.


O então presidente da Volkswagen da Alemanha, Kurt Lotz, veio ao Brasil para inaugurar a Bienal e, assim como as pessoas presentes, ficou encantado com as linhas do esportivo feito pelos designers brasileiros.

Lotz reforçou a produção do veículo cogitando inclusive que ele fosse produzido também na sede na Volks em Wofsburg.

O futuro GT da Volkswagen ilustrou a capa da revista Auto Esporte de abril de 1971. O protótipo já estava praticamente com as linhas definidas, entretanto apresentava sutis diferenças entre elas não havia as 10 fendas para a ventilação do motor na lateral traseira, o bocal de abastecimento era no lado esquerdo, rodas eram de liga-leve e o escapamento era duplo, como nos Fuscas.

Em maio de 1972 a revista Quatro Rodas fotografou na rodovia Castelo Branco um protótipo já com leves mudanças. Entre as alterações citadas pela publicação estavam as fendas nas laterais traseiras para refrigerar o motor.

Motor “deitado” de 1,7 litro não oferecia um desempenho condizente com a proposta do SP2O escapamento passou a ter uma única saída do lado esquerdo e a grade de metal fixado abaixo do parachoque traseiro tinha duas fileiras de perfurações. A anterior tinha somente uma fileira.

O VOLKSWAGEN MAIS BONITO DO MUNDO
Em junho de 1972, foi apresentado ao público o tão aguardado esportivo da Volkswagen. O novo carro foi batizado de SP. Há duas explicações para o tal nome. A primeira em homenagem a cidade de São Paulo, estado onde foi idealizado e produzido, porém existe uma versão, não oficializada pelo fabricante, de que seria a sigla para a expressão em inglês de “Sport Prototype” ou protótipo esportivo.

Independente da origem do nome, a verdade é que o SP causou furor. Suas linhas harmoniosas eram responsáveis por um veículo de rara beleza, a revista alemã Hobby anunciou-o como o “Volkswagen mais bonito do mundo” e a Car And Driver americana conclamou a matriz alemã a produzi-lo em escala mundial. De fato o desenho era totalmente diferente e em nada lembrava o Karmann Ghia tradicional e versão TC. Esse capricho visual resultou em situações curiosas como, por exemplo, uma concessionária da marca precisou chamar a polícia para que as pessoas que cercavam o carro na vitrine fossem embora, pois já havia passado das 22 horas e a loja não podia ser fechada tamanha aglomeração.

Montado sobre a plataforma do TL/Variant, o veículo chamava a atenção por ser baixo apenas 1,15 m de altura. Seu comprimento era de 4,21 metros e a distância entre eixos de 2,40 m. O SP tinha essência de um veículo Grand Turismo, frente longa e baixa, o para-brisa muito inclinado, traseira curta e arredondada, com uma grande tampa que incorporava o vidro traseiro.

Os diminutos para-choques de aço eram fixados diretamente à carroceria e eram recobertos de enduro, um material sintético igual a borracha, e neles eram fixadas as luzes de direção. A frente lembrava a Variant com os duplos faróis dentro de uma caixa plástica. Para acentuar as linhas laterais foram adicionados frisos avermelhados fluorescentes. O bocal para o tanque de combustível migrou para o para-choque do lado direito. 

As lanternas traseiras estreitas estendiam-se até as laterais, já a luz de ré era um pequenofarolete fixado do lado esquerdo abaixo do para-choque. A única luz de ré ficava fixada sob o parachoque de borracha / O cuidado estético estava presente até nas fendas para refrigeração do motorEntre as novidades apresentadas pelo SP estava o limpador de para-brisa pantográfico do lado esquerdo que aumentava a área de varredura do vidro. Ele também foi o primeiro veículo nacional a ter alavanca de acionamento dos limpadores de para-brisa na coluna de direção.

Já os pneus radiais 185/14 eram usados pela primeira vezem um Volkswagen brasileiro, junto com largas rodas aro 14 de oito furos.Bancos de couro com múltiplas regulagens, o SP2 sabia tratar bem seus ocupantesEntretanto alguns pontos deixavam a desejar, entre eles o desempenho. Apesar de a silhueta indicar que se tratava de um automóvel veloz o comportamento dinâmico do SP era igual aos seus irmãos “familiares” TL e Variant. Foram disponibilizadas duas versões: a SP1 equipada com motor de 1584 cm³ de 65 cv e 11,8 m.kgf de torque. O modelo mais potente era o SP2 com motor de 1679 cm³ de 75 cv e 13 m.kgf de torque. Essa versão de 1,7 litro “abrasileirada” trazia 88 mm de diâmetro dos cilindros e 69 mm de curso dos pistões. A taxa de compressão era de 7,5:1 e o motor era alimento por dois carburadores Solex de 34 mm. Como na Variant, o motor era de construção plana, com a turbina de refrigeração montada no virabrequim. Apesar de todo esse tempero mais forte o desempenho final do SP2 não empolgava.

Segundo o teste da revista Quatro Rodas, na época do lançamento oSP 2 fazia de 0 a 100 km/h em 17,4 segundos e atingia velocidade máxima de 154 km/h, pouco para um veículo de pretensões esportiva.
Já no comportamento dinâmico fazia bonito graças ao baixo centro de gravidade que contornava curvas com segurança, ajudado em parte pelos pneus radiais.

INTERIOR DE LUXO 
Na parte interna o SP2 também surpreendia ao trazer um acabamento de luxo e esmero. Os bancos de encostos altos contavam com encosto reclinável e o apoio de cabeça podia ser regulado em altura. Como opção havia revestimento em couro. As amplas portas também recebiam acabamento em couro e do lado do passageiro havia uma luz de leitura. O tapete que reveste o assoalho é de buclê espesso.

O painel de plástico injetado de desenho próprio traz seis mostradores redondos. Na frente do motorista fica o conta-giros, à direita e ao lado o velocímetro com marcação até os 200 km/h e as luzes-espias.

Pela primeira um Volkswagen brasileiro recebia pneus radiais e rodas de ‘tala larga’O volante esportivo de três raios da marca Walrood. O console central de grandes proporções abriga quatro pequenos mostradores voltados ao condutor, são eles marcador do nível de combustível; amperímetro; relógio e temperatura de óleo do motor. Logo abaixo temos o rádio AM/FM com toca-fitas, teclas de interruptor de luzes e do ventilador elétrico.

Painel com instrumentação completa primava pela segurança já que era todo almofadadoSuas linhas harmoniosas conferiam uma beleza única ao SP2, que despertou interesse até da mídia automotiva estrangeiraNos bancos há um apoio de braço e duas alavancas para controlar o fluxo de ar frio e quente. O para-sol conta com um pequeno espelho. Apesar da segurança não ser um tema recorrente naquele período o SP2 apresenta interior acolchoado e material plástico maleável para evitar pontas em caso de colisão. Também foi o primeiro veículo nacional a trazer os cintos de segurança de três pontos de série, embora não fosse retrátil. Devido ao motor ter ventoinha plana, o SP2 tinha dois porta-malas; um de 140 litros na dianteira e outro de 205 litros na traseira. 

Como todo bom esportivo, pouco luxo no interior das portas / O volante esportivo e de pequeno diâmetro era exclusivo do SP2 Apesar do prestigio alcançado e de seus atributos, o Volkswagen SP2 teve sua produção cessada em dezembro de 1975. Em dois anos e meio de produção foram vendidas 10.193 mil unidades, sendo que seu melhor ano de venda foi em 1972 com mais de três mil unidades entregues. A versão SP1 vendeu somente 168 unidades, sendo hoje um modelo muito raro. Passados 42 anos de seu lançamento, o SP2 ainda atrai olhares e coleciona uma legião de fãs pelo Brasil e no redor do mundo. Foi modelo importante e divisor de águas, dentro da própria Volkswagen, tanto que a marca no Brasil possui um SP1 Platina em seu acervo e o museu da Volkswagen em Wolfsburg na Alemanha possui outro SP2 branco Lótus em sua coleção.

Retrovisor com design clássico / Um esportivo projetado e fabricado no Brasil, o SP 2 é motivo de orgulho a colecionadores   

Apoio de braço largo e alavancas para controle de fluxo de ar, comodidades presentes no SP2Volkswagen SP2 Carioca
O advogado aposentado Eugenio de Camargo Leite é apreciador de automóveis e depois que passou a frequentar os eventos que reúnem os clássicos na cidade de São Paulo, despertou o desejo de ter um veículo antigo em sua garagem.

“O Volkswagen SP2 que ilustra a reportagem foi um sonho realizado que cultivava há muito tempo. Eu sempre gostei das linhas do SP2, era um veículo singular para sua época”, explicou Eugenio.

Foi por intermédio de um amigo que Eugenio Camargo soube de um SP2 à venda na cidade do Rio de Janeiro. O carro pertencia a um único dono e fazia parte de um inventário. Assim que soube foi ver o carro e mesmo após todos os tramites e demora na finalização do inventário, o advogado fechou o negócio. Assim que recebeu o Volkswagen SP2, Eugenio contou que apesar do carro estar bem cuidado a cor não era a original. 

“Logo que recebi o SP2 procurei resgatar a cor original chamado de Branco Lótus, pois a pintura era um tom de branco usado pela Chevrolet. O restante do veículo como acabamento está original e não precisou de reparos”, disse Eugenio Leite.

Um ícone esportivo totalmente desenvolvido no Brasil: VW SP2