Todas as medidas devem ser seguidas rigorosamente! Foi assim que iniciou e terminou o aprendizado sobre o recondicionamento de turbocompressores na Platopar, em Luis Eduardo Magalhães, na Bahia, onde o proprietário Alex Sandher Zuffa e o técnico especialista no assunto Juarez Antonio Hellstrom mostraram todos os detalhes do serviço.
Apesar deste tipo de reparo ser comum há bastante tempo e sua viabilidade ser comprovada pelo fato de as principais fabricantes fornecerem o produto com a opção recondicionada, ainda há muita desconfiança por parte dos consumidores quanto à qualidade do serviço, até porque muitas vezes já foram lesados ou ficaram sabendo de histórias sobre o assunto.
Peças de reposição
Mas se até os fabricantes o fazem, é porque há um jeito certo de realizar o reparo. Segundo Alex, é aí que entra o lado obscuro deste mercado, pois os fabricantes possuem peças para reposição e as utilizam no seu produto, porém, estas peças não são comercializadas. Há importadores e, como não podia ser diferente, boa parte do que chega vem da China, e a questão da qualidade pode variar muito.
Os eixos são as partes mais sensíveis da turbina e uma falha poderá acarretar grande prejuízo. Então, o melhor é utilizar um produto original. Mas como se os fabricantes não comercializam? Alex compra turbinas sem recuperação ou com reparo inviável de oficinas da região e as desmonta. O que estiver dentro das tolerâncias, será tratado e guardado.
Dessa maneira, ele possui um estoque de eixos, conjuntos centrais e carcaças para utilizar no reparo ou montar outras turbinas, garantindo o uso de um produto de boa procedência. Outros itens, como os anéis de vedação, mancais, colar, anel de encosto, são encontrados facilmente com boa qualidade no mercado.
Nem sempre a culpa é do turbo
A grande vantagem de trabalhar com turbocompressores é a possibilidade de identificar o que ocasionou o dano no equipamento mesmo sem o veículo presente, mas, para isso, precisa ser desmontada, e algumas falhas parecem claros problemas na turbina, podem ser resolvidas sem a remoção da mesma; isso se for diagnosticado rapidamente.
Segundo Alex e Juarez, a maior causa de falhas no motor e danos no turbo é a falta de manutenção no filtro de ar. Por incrível que pareça, pela simplicidade da peça e facilidade de troca, muitos nem sequer o examinam, mesmo com insistente recomendação de que deve ser o primeiro item observado.
Juarez lembra diversos casos de solicitação de garantia onde foram encontrados filtros de ar em péssimo estado, após a insistência do instalador em afirmar que o mesmo era novo.
Por isso, lembre-se sempre, que veículos turboalimentados requerem atenção especial ao filtro de ar e mangueiras que o ligam até a turbina. Dependendo da localização, o cuidado deve ser dobrado, pois a admissão de areia ou outras impurezas é fatal para a turbina e o motor.
Antes de remover
Perda de desempenho e ruídos
Neste caso, antes da remoção do turbo, confira, além das mangueiras de admissão de ar, as mangueiras de pressurização. Caso utilize intercooler, vale verificar vazamentos e também o acúmulo de óleo lubrificante oriundo da turbina.
Também devem ser analisadas as mangueiras e o funcionamento da válvula waste-gate. Para isso, remova a mangueira e aplique pressão de trabalho no local; a válvula deve acionar a portinhola de liberação dos gases livremente. Se tiver passado por alguma manutenção recente, verifique a regulagem da haste.
Passagem de óleo
Quando a passagem for para o lado da admissão, novamente uma restrição no filtro de ar pode ser a causa, então é o primeiro suspeito. Também há muita incidência de obstrução do retorno do óleo lubrificante para o cárter, e aí poderá aparecer tanto na admissão quanto no escapamento.
Em instalações recentes, pode ocorrer mau posicionamento desse retorno, que deverá estar acima do óleo depositado no cárter. A curvatura da mangueira também não deverá ser muito acentuada, pois dificultará o escoamento.
Recondicionamento
Quando o turbocompressor chega às mãos de Juarez, é iniciada a desmontagem, que, dependendo do tempo de uso e condições da peça, pode ser bem dificultada. Isso porque a oxidação chega a impedir a retirada dos parafusos da caixa quente, que precisa ser feita com uma talhadeira. Na montagem, o furo é limpo e é utilizada uma rosca postiça para perfeita fixação da carcaça.
Para a remoção da caixa quente também é preciso algumas pancadas, mas com cuidado, pois há o risco de trincar a mesma. Após a completa desmontagem, os componentes vão para uma limpeza para posterior análise. “Em peças muito carbonizadas, às vezes é preciso realizar banho químico e dar um jato de areia para remover todos os resíduos”, explicou Juarez.
Casos de alta temperatura são logo identificados por trincas na caixa quente, derretimento das pás do rotor e do prato térmico, que tem a função de conter a temperatura que vem do lado quente do turbo para o conjunto central, evitando o superaquecimento ou carbonização do eixo nos pontos de lubrificação.
Segundo ele, os casos mais recorrentes de superaquecimento são por veículos que utilizam a bomba injetora aberta. A temperatura de queima aumenta cada vez mais e também a dos gases de escape, ocasionando o problema.
Eixos que sofrem superaquecimento ficam azulados e não podem ser reutilizados, devido à perda do tratamento térmico que irá provocar quebra precoce do componente. Para soltar o rotor do lado frio do eixo, sempre deve ser utilizado um cabo em ‘T’, pois este divide a força e evita danos ao componente.
O lado quente, não pode ser substituído, pois é soldado por atrito, e não existe essa tecnologia na reposição. “Uma vez, para teste, uma empresa se ofereceu para soldar estas peças. Foram quatro eixos; três se quebraram na primeira semana, o quarto não foi instalado”, comentou Alex.
As medidas
Para uma pré-avaliação da turbina que todos costumam fazer, movimentando o eixo e sentindo a folga radial (movimentação lateral), é bom ter em mente que essa deve ser de um décimo de milímetro - soma da folga de lubrificação dos mancais, de 0,07 mm para a carcaça e 0,03 mm para o eixo.
A folga axial (empurrando e puxando) não deve existir, pois é ajustada entre o colar e o mancal central, que é aplicado novo em cada recondicionamento de turbina, representando cerca de 10% do custo. Porém, é responsável por evitar qualquer deslocamento do eixo, tendo assim importância vital na vida útil.
As principais medidas são feitas baseadas em duas tabelas, uma para eixo e outra para carcaça central. As duas informam as medidas das peças originais (Standard – STD) e pós-retífica (005, 010, 015 e 020). Lembre-se que, assim como na retífica de motores, esses são valores em polegadas, portanto, 010, representa 0,010”, ou 1 centésimo de polegada, equivalente a 0,254 mm.
Para melhor interpretação e precisão dos resultados, o ideal é utilizar um paquímetro digital de boa qualidade na análise de um turbocompressor.
Eixo
Como exemplo, vamos pegar na tabela o eixo de uma turbina Garret T04, que tem uma vasta aplicação em motores MWM e Perkins de quatro cilindros, muito utilizada nas picapes F1000, F4000, D20 e Silverado. A medida STD deve estar entre 10,15 e 10,16 mm, esta é a tolerância padrão que deve ser respeitada nas medidas de uma turbina. Um centésimo de milímetro.
Alex e Juarez informaram que a medida máxima que utilizam para eixos é 010, ou seja, com menos 0,254 mm, que medindo o eixo seria de 9,89 a 9,90 mm. Acima desse desgaste, o eixo já não é mais confiável. A retífica de um eixo é feita na mesma máquina utilizada para virabrequins, que deve ser muito bem manuseada e ajustada para não deixar conicidade na peça.
“Testei todas as retíficas da cidade, conferindo a conicidade deixada por cada uma delas. Hoje só levo em uma; a única que consegue deixar um valor tolerável. Isso foi muito importante para aumentar a confiabilidade do serviço”, informou Alex.
Após a retífica, ou mesmo quando novo, o eixo precisa ser balanceado, e este é extremamente sensível. Os horários escolhidos por Juarez para realizar este serviço, são sempre no almoço ou no fim do dia, quando não há mais nenhuma máquina ligada, funcionário batendo ou fazendo barulho, pois influencia diretamente no resultado.
“É bom até evitar falar próximo à máquina, para evitar que a vibração acústica interfira no balanceamento”, afirmou Juarez. Para se ter uma ideia de tamanha precisão, Alex explicou que em uma determinada data teve quatro quebras num curto período.
Desconfiado do que poderia estar acontecendo, reparou que utilizava uma caneta marca texto para fazer o lacre do balanceamento, então pediu a aplicação de outro sistema. Acabaram-se os problemas.
Carcaça central
O limite de uso para uma carcaça central utilizado na Platopar é 015, ou seja, um desgaste máximo de 0,381 mm. Como exemplo, vamos utilizar a mesma turbina Garret TO4, que, segunda a tabela, nos indica uma medida original de 15,80 a 15,81 mm e com uma medida 015 já estaria aberta para 16,18 mm, com tolerância de 0,01 mm (um centésimo de milímetro).
Os mancais são comercializados com diversos tipos de medidas, combinando medidas de eixo e de carcaça, podendo ser eixo STD e carcaça 005, ou eixo 005 e carcaça 010, e assim por diante.
Os anéis de vedação são vendidos com diversas sobremedidas, devido ao desgaste na canaleta onde são alojados. Estas precisam ser retificadas para recuperar os ângulos. Uma forma prática de ver se o anel está com a folga correta em relação à canaleta é tentar tombá-lo com o dedo. Se ele cair, é porque a folga está muito grande.
Nas turbinas utilizadas em picapes, as canaletas podem ser abertas para até 160 mm e nos caminhões para até 220 mm. A partir daí, é necessário fazer o embuchamento da carcaça, e, em alguns casos, é possível utilizar até dois anéis de vedação.
A folga entre as pontas dos anéis deve estar entre 0,05 e 0,15 mm, por isso as sobremedidas são representadas por um valor que indica o diâmetro do anel em polegadas e a largura em milímetros. Por exemplo, 552 X 140, ou seja, 0,552” (14,02 mm) de diâmetro por 0,140 mm de largura.