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Convenção das concessionárias norte-americanas: comemoração e boas perspectivas de futuro


Evento realizado em Las Vegas na primeira semana de abril mesclou palestras e exposição de produtos e serviços para concessionárias que comemoraram os bons resultados na venda de veículos novos em 2015 e boas perspectivas para 2016

Por: da redação - 20 de maio de 2016

Quem conhece os princípios do melhoramento contínuo sabe que uma das práticas mais saudáveis desta filosofia gerencial é o benchmarking, que pode ser traduzido livremente como o estudo comparativo de outras empresas, setores, clientes, e até mesmo concorrentes para aprender com eles.

E como prática, o Grupo Oficina Brasil faz isso há muitos anos e traz estampado, nas páginas do Jornal Oficina Brasil, o que pode ser utilizado imediatamente por nossos leitores e que também permita a reflexão e um melhor entendimento do mercado e quais as tendências que podem vir a influenciar nossa realidade. E à luz deste espírito é que apresentamos um relato sobre a Convenção da National Automobile Dealers Association (NADA), que é a associação correlata à nossa FENABRAVE, que estava representada no evento com um comitiva liderada por seu presidente Alarico Assumpção Junior.

Prestes a completar 100 anos em 2017, a NADA realizou sua convenção e exposição entre 31 de março a 03 de abril de 2016 em Las Vegas, com uma programação bastante abrangente e que mesclou atividades comerciais com mais de 600 expositores que apresentaram ao mais de 24 mil participantes uma série de produtos e serviços para o dia-a-dia de uma concessionária, desde empresas de projeto e construção civil, passando por máquinas e equipamentos, serviços financeiros, softwares (como sistemas DMS – Dealer Management Systems) e uma grande quantidade de empresas de consultoria ligadas à Internet e às mídias sociais para otimização de campanhas on-line dirigidas aos potenciais compradores de carros novos.

Ao contrário do momento em que vivemos atualmente no Brasil, a venda de veículos novos em 2015 nos Estados Unidos atingiu a marca de 17,4 milhões de unidades vendidas, apenas no segmento de automóveis e comerciais leves, num crescimento de 5,8% em relação a 2014 e com projeção de 17,7 milhões para 2016, num ciclo positivo que mostra a recuperação da indústria automotiva estadunidense pós-crise econômica de 2008.

Se por um lado as notícias sobre o aumento de vendas são positivas, o número de concessionárias em atividade no ano de 2015 perfaz 16.545, e é 10,5% menor que o registrado em 2008 quando havia 18.495 concessionárias, considerando que 90% das concessionárias são associadas à NADA, conforme apresentado no gráfico a seguir.

Neste cenário otimista, a grande tônica foi justamente a comemoração e a celebração dos resultados alcançados em 2015 e as boas perspectivas para 2016.

SESSÕES DE PALESTRAS

A grade de palestras estava dividida em grandes temas como Marketing Digital e Tradicional, Recursos Humanos, Fóruns Executivos, Legislação e Regulamentação, Custos Variáveis e Custos Fixos, com várias palestras ocorrendo simultaneamente.


Dentre as palestras relativas aos Custos Fixos de uma concessionária, que é onde está enquadrado o setor de peças e serviços, os principais temas abordados estavam relacionados à retenção de clientes no setor de peças, formas de recuperar os clientes do setor de serviços dos concorrentes, formação de preço e estoque e sobre os desafios relativos à mão-de-obra no setor de serviços, uma vez que há uma grande escassez de mão-de-obra técnica (reparadores) e de jovens que se interessem pelo assunto para formar uma nova geração de profissionais. A seguir um breve resumo destas palestras que ilustram um pouco sobre a forma de enxergar e pensar o mercado pela perspectiva da concessionária de lá.

Jack Simmons, do portal cars.com, apresentou a palestra “Cinco formas de retomar dos concorrentes os lucros do setor de serviços” em que desafiou os presentes a deixar de pensar como gerentes e diretores de serviços mas a pensar como consumidores, principalmente num momento em que a taxa de retenção dos clientes fora do período de garantia está aumentando em um mercado estimado de USD 310 bilhões em peças e serviços e em que a participação das concessionárias é de 26% atualmente, com tendência de queda.

Para dramatizar ainda mais a situação do mercado, Simmons apresentou dados relativos à busca orgânica no Google em que os primeiros resultados que aparecem na pesquisa com as palavras-chave “serviços e reparos” são Firestone, PepBoys, Jiffy Lube e Midas, e nos quais a rede de concessionárias aparece em menos de 10% dos resultados.

Como estratégia para reverter este quadro e participar numa fatia maior deste, literalmente, bilionário mercado, a principal linha de ação para Simmons é atender o cliente a partir de um modelo de satisfação deste que parte do atendimento das expectavas mínimas até a construção da lealdade e confiança, além de apresentar uma segmentação bastante interessante sobre o perfil dos consumidores que, segundo pesquisa realizada pela cars.com, podem ser divididos entre os que são passiveis de lealdade, e estariam interessados em desenvolver este relacionamento com uma concessionária, e aqueles que não são passíveis de lealdade e não formariam o público-alvo ideal.

Na palestra “Retenção de clientes no departamento de peças”, Jim Phillips, da NADA Academy, argumentou que qualquer plano de melhoria numa empresa está baseado em redução de despesas, aumento de margem ou venda para mais clientes, e que, de um modo geral, controle de despesas e aumento de margem não são problemas recorrentes no departamento de peças de uma concessionária, restando como opção óbvia a venda para mais clientes, que poderia ser dividida entre vender mais para os clientes atuais e vender mais para novos clientes.

A partir deste raciocínio, Phillips apontou 5 elementos-chave para uma estratégia de retenção que passam por: (1) estoque adequado, (2) melhor suporte ao setor de serviços, (3) diversificação entre acessórios, pneus e venda no atacado, (4) ações que “desempatam” o jogo como promoções, catálogo de peças on-line com preço e disponibilidade (pensando naqueles clientes que se valem do “varejo multicanal” e pesquisam na Internet antes de decidir a compra) e (5) motivação dos funcionários.

Na oportunidade de retenção específica para vendas no atacado, o primeiro comentário foi que “preço não é tudo” e que as vendas por este canal devem começar pelos negócios mais próximos da concessionária (como oficinas mecânicas). Outro ponto destacado por Phillips é que cada venda neste canal é importante e que uma das chaves é oferecer algo de valor percebido que os competidores tenham dificuldade de ter igual ou equivalente.

Presente na palestra estava Carlos Sandoval, que é Diretor de Peças e Serviços da concessionária Bartow Ford na cidade de Bartow na Flórida. Para Sandoval o que foi apresentado na palestra é o básico do que ele já faz em sua empresa: “nós vendemos mais de 1 milhão de dólares por mês em peças para as oficinas da região, temos dois vendedores que fazem a praça. Se o dono do carro prefere as oficinas independentes ele deve ter suas razões, mas o importante é que ainda posso vender peças para os reparos que ele faz”. (Veja entrevista com Sandoval na página 28).

Chuck Hartle, da empresa PartsEdge, foi o apresentador de uma palestra dirigida aos profissionais do departamento de peças das concessionárias com foco na “Maximização do lucro em peças”, em que apresentou um modelo para estratégia de precificação eficiente com inspiração nos ciclos clássicos da gestão como o PDCA (Plan-Do-Check-Act).

Em sua apresentação, Hartle ressaltou que a principal falha na rentabilidade do setor de peças está no processo de precificação, que continua o mesmo há anos e que muitas oportunidades de venda são perdidas pela análise deficiente do portfólio de vendas, principalmente em função do mito dos 40% de rentabilidade em peças, que acaba por mascarar a real competitividade das concessionárias e restringir a expansão comercial.

Outro ponto de destaque da palestra foram as sugestões apresentadas para aumento de vendas no atacado com a criação de um programa de fidelização e recompensa para os clientes que não atrasam seus pagamentos, compram consistentemente e com volumes decentes e que, principalmente, fazem poucas devoluções de produtos. Como curiosidade, o padrão de desconto no preço de venda varejo (consumidor) para a venda atacado é de 25%.

Para apresentar o problema enfrentado no mercado estadunidense relativo à falta de técnicos automotivos, Brett Coker, da Coker Automotive Consultants e David Martin, da The Mar-Kee Group, iniciaram a palestra “Técnicos são ouro: como está sua mineração” alertando os presentes sobre a real falta de técnicos automotivos no mercado de concessionárias e que estão presenciando uma canibalização entre as concessionárias, que fazem ofertas hostis com pacotes de salários e benefícios para atrair e retirar técnicos umas das outras.

Trazendo dados e fatos para a discussão, os apresentadores estimam que nacionalmente existe uma falta entre 25 mil a 100 mil técnicos automotivos, fato que é agravado pela ausência de matérias profissionalizantes no ensino médio, bem como uma percepção negativa sobre a indústria de reparação.

Além disso, dois outros fatores que influenciam esta debandada é a alta demanda por profissionais no segmento de veículos recreativos e no segmento marítimo e o fortalecimento do mercado de trabalho de um modo geral.

Como antídotos e alternativas para este grave problema as soluções passam por estratégias de retenção, proficiência e recrutamento, tarefas clássicas de gestão de pessoas e processos. No item retenção foi sugerido que os gestores enfatizem o respeito, o reconhecimento e a comunicação, além de propiciar alguns benefícios como flexibilidade de horário, planos de remuneração variável, além de outros benefícios como plano médico e seguro de vida, férias, pagamento das ferramentas e outras soluções criativas que possam contribuir para a retenção destes profissionais.

Cabe aqui um ponto importante que diferencia a legislação trabalhista brasileira e estadunidense, pois pode parecer estranho que férias e pagamento de ferramentas sejam oferecidos como estratégias de retenção. Não existe na legislação estadunidense (que não é única, pois cada Estado tem autonomia para legislar) a mesma regra que temos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que garante 30 dias de férias remuneradas após 12 meses de trabalho, lá a negociação de férias é feita no momento da contratação e, na maioria dos casos, o empregado ganha um dia de férias por cada ano trabalhado.

E em relação às ferramentas, nos Estados Unidos são os reparadores que compram suas próprias ferramentas e as levam quando mudam de emprego. Dentro desta lógica, os reparadores mais experientes (tempo de profissão) são aqueles que têm mais ferramentas.

Para a estratégia de proficiência a sugestão foi a definição de novos padrões de produtividade e eficiência, melhorando a relação da área de serviços com a área de peças, a designação de um aprendiz para acompanhar este profissional experiente, adoção de tecnologia para melhorias logísticas e operacionais e uso de comunicação com dispositivos mobile. Além disso recomendaram fortemente o investimento em treinamento, planos de remuneração variável por desempenho e a criação de equipes de profissionais para otimizar o trabalho, usando como exemplo a imagem de uma equipe da NASCAR.

Outra curiosidade apresentada nesta palestra foi a distribuição do tipo de reparo executado nas oficinas independentes dos Estados Unidos: 80% reparo (corretiva) e 20% manutenção (preventiva).

IMPRESSÕES GERAIS

Embora ofuscados pelas celebrações do enorme sucesso da venda de veículos novos, os setores de serviços e peças também mostraram sua força e importância no resultado das concessionárias dos Estados Unidos.

Mas os desafios de lá são muito parecidos com os desafios de cá. O interesse pela venda de peças ainda precisa ser desenvolvido e uma orientação  a favor da oficina independente, que deve ser vista como cliente, não é compartilhada integralmente pelo mercado.

Pudemos sentir a força e a representatividade do segmento pelos impressionantes números apresentados, pela presença maciça de participantes e expositores e, acima de tudo, pela atuação forte e vigorosa junto ao Congresso e aos congressistas como fez questão de apresentar o presidente da NADA no evento de abertura.

Porém nossas convicções foram reforçadas com tudo o que foi visto e aprendido nos dias do congresso: a oficina mecânica independente é tão importante lá nas terras do Tio Sam quanto aqui e quem entende o papel do reparador independente e da oficina no mercado, tem melhores resultados.