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Motores Elétricos II – conceitos básicos e configurações mais utilizadas em aplicações automotivas


A presente matéria tem por objetivo abordar os conceitos relacionados com os motores DC sem escovas, utilizados em eletrônica embarcada veicular, que vão substituindo os anteriores motores DC com escovas (abordados na edição anterior)

Por: Humberto Manavella - humberto@hmautotron.eng.br - 23 de março de 2017

A principal característica destes motores é que, ainda sendo alimentados com tensão contínua, dispensam o uso de escovas.

Desta forma, elimina-se o faiscamento (característico do motor DC com escovas) juntamente com outras limitações tais como o ruído provocado pela comutação e a velocidade máxima. Já, o motor DC sem escovas supera estas limitações podendo atingir velocidades maiores com menos ruído, maior eficiência e confiabilidade. Praticamente o único item mecânico que sofre desgaste são os rolamentos.

Atualmente, três são os tipos de motores DC sem escovas utilizados nos sistemas de eletrônica embarcada:

1. Motor BLDC com ímãs permanentes no rotor;

2. Motor SRM de relutância comutada (sem ímãs permanentes);

3. Motor de indução (sem ímãs permanentes).

Outras características relevantes são:
a) Ao contrário do motor DC convencional, no motor BLDC e no SRM os eletroímãs se encontram no estator. A potência é fornecida, de forma seqüencial, aos pares de enrolamentos do estator, o que é um fator de simplificação construtiva, já que não há necessidade de alimentar um elemento móvel como é o caso do motor DC convencional. Com isto, o arrefecimento é facilitado.

b) Em função da necessidade de energizar os eletroímãs de forma não contínua, estes motores não podem ser alimentados diretamente com tensão DC. Como será visto a seguir, um circuito eletrônico de controle (fig.1) realiza a comutação dos eletroímãs, condição esta necessária ao funcionamento dos motores BLDC e SRM. No caso do motor de indução trifásico esta função é cumprida pelo inversor que gera 3 ondas senoidais a partir da tensão DC de alimentação.

Figura 1
Com base na informação do sensor de rotação, o qual também indica a posição do rotor, o módulo de controle, através do comutador/inversor, energiza os eletroímãs em seqüência, sincronamente com o giro do rotor (SRM e BLDC) ou alimenta o motor com tensão trifásica (indução).

c) Num motor DC convencional, o torque é produzido através da interação de 2 campos magnéticos (separados) por forças de atração e de repulsão. No motor DC sem escovas, pelo contrário, o torque é produzido somente por atração magnética (motor BLDC e motor de indução) ou por forças de relutância (motor SRM).

d) A cada giro do motor com escovas, o rotor experimenta inversão de fluxo magnético, o que resulta em perda de energia no rotor.

Pelo contrário, nos motores BLDC e SRM, em função de não haver inversão de fluxo, não há perdas. Todas as perdas se localizam no estator, o que resulta no resfriamento facilitado.

e) Em função do controle eletrônico, o motor sem escovas é mais preciso que o de controle mecânico.

f) Não há faiscamento e, portanto, desgaste de escovas.

g) Permite a implementação de um maior número de eletroímãs no estator, para um controle mais preciso.

h) Com relação ao motor DC com escovas, apresenta maior densidade de potência. Ou seja, maior potência desenvolvida por unidade de volume.

i) Os motores BLDC e SRM são motores síncronos cuja velocidade é função da freqüência de comutação dos eletroímãs. De uma outra forma, o chaveamento dos eletroímãs dá origem a um campo magnético giratório que “arrasta” o rotor com a mesma velocidade de rotação, a qual é controlada ajustando a freqüência de comutação dos eletroímãs. 

1. Motor BLDC (brushless DC) – Motor DC sem Escovas
São conhecidos também com outras denominações: Motor sem escova de ímã permanente, motor AC de ímã permanente, motor síncrono de ímã permanente. Isto é devido a que o motor DC sem escovas não funciona diretamente de uma fonte de tensão DC, o seu funcionamento é similar ao de um motor DC. 

A potência é fornecida através de uma fonte de tensão contínua e de um sistema de controle eletrônico que realiza a comutação das fases.

O motor possui o rotor com ímãs permanentes e o estator com bobinados geradores de campo magnético conectados a um circuito eletrônico de controle que substitui o conjunto anel comutador/escovas (do motor DC) e tem por função energizar as bobinas numa seqüência rotativa em torno do rotor. Bobinas opostas são energizadas simultaneamente, gerando um campo magnético entre elas. 

As bobinas do estator energizadas num determinado instante atraem o ímã no sentido de alinhá-lo, o que provoca a sua rotação. Assim que o ímã se alinha com o estator, é energizado o próximo par de bobinas na seqüência. Para atingir estes objetivos o motor BLDC requer um sofisticado circuito eletrônico de controle.

Funcionamento - A figura 2 será utilizada como exemplo no qual, para cada comutação de bobinas, o rotor gira 600 no sentido horário.  

- Na figura 2a o rotor encontra-se alinhado com os eletroímãs A e B energizados de forma tal que A é o polo S e B, o polo N. Na figura 2b os eletroímãs energizados são o C e o D de forma tal que C é o polo S e D, o polo N. O rotor girou 600 no sentido horário com relação à posição da figura 2a. Na seqüência são energizados os eletroímãs E e F de forma tal que E é o polo S e F, o polo N. Na seqüência são energizados os eletroímãs A e B de forma tal que agora, A é o polo N e B, o polo S. Na figura 2c os eletroímãs energizados são o C e o D de forma tal que agora, C é o polo N e D, o polo S. O rotor girou 2400 no sentido horário com relação à posição da figura 2a.

Figura 2 - A, B e C
Para a rotação em sentido anti-horário, o módulo de controle comuta as bobinas no sentido inverso ao apresentado no exemplo. Reparar que, dependendo da posição do rotor, cada bobina deve ser energizada de forma a gerar a polaridade necessária, N ou S, para manter a rotação. Exemplo disto são as figuras 2b e 2c, em que as mesmas bobinas são energizadas, mas com polaridade oposta.

2. Motor SRM (switched reluctance motor) – Motor de Relutância Variável ou Comutada
Este motor não possui nenhum tipo de ímã permanente. O estator é similar ao do motor BLDC, no entanto, o rotor está constituído simplesmente de laminações de material ferromagnético com saliências como mostrado na figura 3. O seu princípio de funcionamento é o de “relutância magnética variável”.

Relutância Magnética. A relutância de um circuito magnético é equivalente à resistência de um circuito elétrico e o fluxo magnético equivalente à corrente. Da mesma forma que um campo elétrico faz a corrente elétrica seguir o caminho de menor resistência, um campo magnético faz o fluxo magnético seguir o caminho de menor relutância. Assim, um elemento de material ferromagnético (ferro, níquel, cobalto, etc.), presente num campo magnético, tende a se alinhar com o sentido do campo, o que provoca a diminuição da relutância e com isto, o aumento do fluxo. 

Como no motor BLDC, as bobinas do estator são energizadas em seqüência com um padrão rotativo gerando o torque necessário à movimentação do rotor. A diferença é que, neste caso, a orientação do campo magnético gerado pelos eletroímãs é irrelevante. As bobinas dos eletroímãs opostos são conectadas em série e energizadas sempre, com a mesma polaridade. No caso do motor de relutância variável, o rotor possui segmentos (saliências ou protuberâncias) de baixa relutância alternando com segmentos de alta relutância. Uma característica importante é que o número de polos (pares de bobinas) do estator é diferente do número de saliências do rotor. Por exemplo, 6 polos no estator e 4 protuberâncias no rotor.

A cada instante, o rotor forma, com o par de bobinas energizadas, um circuito magnético cuja relutância resulta mínima na situação em que saliências do rotor se alinham com o par de bobinas energizadas e o entreferro (folga entre eles) é o menor. Assim, o torque é produzido pela tendência das saliências a se alinhar com o fluxo produzido pelos eletroímãs do estator. 

Funcionamento - A análise será feita com o exemplo da figura 3 ainda que não seja esta a configuração utilizada nas aplicações atuais. No exemplo, a cada comutação de bobinas o rotor gira 600 no sentido horário.  

Na figura 3a o rotor encontra-se alinhado com os eletroímãs A e B energizados de forma tal que A é o polo N e B, o polo S. Isto, em função de que esta situação é a de menor relutância (mínimo entreferro) do circuito magnético formado pelos eletroímãs e o rotor. Na figura 3b os eletroímãs energizados são o C e o D, de forma tal que C é o polo N e D, o polo S. O rotor girou 600 no sentido horário com relação à posição da figura 3a.  Na seqüência são energizados os eletroímãs E e F, de forma tal que E é o polo N e F, o polo S (posição não ilustrada). O rotor gira mais 60O com relação à posição da figura 3b. Na figura 3c são energizados os eletroímãs A e B, de forma tal que A é o polo N e B, o polo S. Assim, o rotor girou 180O com relação à posição da figura 3a. Na seqüência são energizados os eletroímãs C e D, de forma tal que C é o polo N e D, o polo S (posição não ilustrada). O rotor gira mais 60O com relação à posição da figura [3c]. Na figura 3d os eletroímãs energizados são o E e o F, de forma tal que novamente E é o polo N e F, o polo S. O rotor girou 270O no sentido horário com relação à posição da figura 3a.   

Figura 3 - A, B, C e D
Reparar que a polaridade dos eletroímãs é irrelevante para o funcionamento do motor, já que o torque é produzido por forças de relutância e não por atração de polos magnéticos. 

O importante a ser salientado é que o par de eletroímãs energizado provocará o alinhamento do par de saliências mais próximo. Cabe salientar que este motor não pode funcionar como gerador. 

3. Motor de Indução Trifásico DC
Dois conceitos básicos regem o funcionamento do motor de indução trifásico DC: campo magnético girante e indução eletromagnética.

Campo Magnético Girante: Utilizando como exemplo a figura 4, o conceito pode ser enunciado da seguinte forma: Três correntes senoidais, com a mesma amplitude, mesma freqüência e defasadas de 120 graus (fig.4b), circulando por três bobinas fixas defasadas espacialmente em 120 graus, produzem um campo magnético girante de intensidade constante (fig.4a).

Figura 4 - A e B
Indução Eletromagnética - Lei de Faraday:
Esta lei rege o processo de indução eletromagnética e pode ser enunciada da seguinte forma: Uma força eletromotriz (f.e.m.) é induzida numa bobina sempre que o fluxo magnético que a atravessa varia no tempo e a magnitude da f.e.m. assim gerada é diretamente proporcional à taxa de variação do fluxo. Aplicando isto a um circuito fechado provoca a circulação de uma corrente que gera um campo magnético que se opõe àquele que induziu a f.e.m. 

Os motores de indução utilizados nos sistemas de eletrônica embarcada veicular são do tipo trifásico. A figura 5a apresenta a configuração básica de um motor de indução com rotor tipo gaiola (fig.5d). A figura 5b mostra o circuito equivalente de um motor com a configuração estrela, em que o inversor cumpre a função de gerar as ondas sinoidais de energização das bobinas do estator. Como mostra a figura 5c, as ondas estão defasadas em 120 graus entre si. Reparar que quando uma senóide está com valor máximo, as outras duas estão com metade do valor e sinal contrário. 

Figura 5 - A e B
Figura 5 - C

A figura 5d mostra a configuração do rotor tipo gaiola de esquilo, em que barras condutoras são alojadas em ranhuras de um núcleo ferromagnético (não indicado na figura). As barras condutoras formam espiras curto-circuitadas pelos anéis dos extremos. 

O processo de arranque do motor é o seguinte:
a)
Ao alimentar as 3 bobinas do estator com a tensão AC trifásica, se estabelece campo magnético de amplitude constante que rotaciona sincronamente (com a mesma freqüência) com a tensão de alimentação. Neste ponto, o rotor ainda permanece estacionário.

b) A rotação do campo faz com que o fluxo magnético que atravessa as espiras varie sincronamente com a tensão da alimentação. Ou seja, as espiras são atingidas por um fluxo variável que causa o aparecimento de uma força eletromotriz (f.e.m.) induzida. 

c) Devido a que as espiras estão curto-circuitadas pelos anéis, formando, assim, um circuito fechado, a f.e.m. provoca a circulação da corrente i, que por sua vez cria um campo magnético que se opõe à causa que o origina (lei de Lenz) que é o campo girante. Assim, os campos são de polaridade oposta.

d) Neste caso, a causa que produz a corrente i nos condutores do rotor , e o campo magnético resultante, é o movimento relativo entre o campo magnético girante e o rotor estacionário.

e) Em função de o rotor estar estacionário, a taxa de variação do fluxo girante que atravessa as espiras é máxima. Como resultado, pela lei de Faraday, a f.e.m. induzida e a corrente resultante são máximas. Conseqüentemente, o campo magnético gerado no rotor e que se opõe ao campo girante também tem intensidade máxima. 

f) Nesta situação e em função de serem as polaridades opostas, o rotor entra em movimento, tentando acompanhar o campo girante. Ou seja, este último “arrasta” o rotor.  

Nota: Tanto o motor de ímã permanente como o motor de indução trifásico podem funcionar como gerador quando o rotor é acionado mecanicamente, por uma fonte externa. Este é o caso do motor/gerador utilizado nos híbridos, nos quais o motor de combustão aciona o gerador para recarga da bateria. O mesmo acontece durante a frenagem regenerativa, em que funciona como gerador, transformando a energia cinética do veículo em energia elétrica para recarga da bateria.