A indústria automotiva tem feito um investimento muito elevado na evolução dos seus produtos. O termo mais recorrente atualmente é Eficiência Energética. Isso significa que teremos uma nova onda de motores e tecnologias, algumas novas, outras já conhecidas, mas, agora aplicadas de forma integrada, o que foi possível com a evolução dos sistemas de controle e principalmente pelas redes de comunicações a bordo dos veículos.
A oficina é o local onde iremos enfrentar dia a dia esses desafios, também devemos buscar a eficiência, porém trabalhamos de certa forma com a engenharia reversa, temos que aprender como funciona algo já apresentado e em circulação no mercado. Nossos clientes virão até nós com veículos mais sofisticados, com uma integração eletrônica cada vez mais complexa. Diante deste quadro percebo que a principal mudança na oficina deve ser a busca pela eficiência e isto começa pela cultura dentro da oficina, não temos e não teremos um profissional completo, o que devemos formar é uma equipe que busque o aprendizado e a troca de informações, discuta sobre o veículo, o problema apresentado e trabalhe em equipe para a solução. E na construção deste aprendizado, devemos usar o investimento realizado em equipamentos. Scanner automotivo, analisador de gases, osciloscópio, multímetros, medidor de pressão e vazão de combustível, máquina de teste e limpeza de bicos são ferramentas de trabalho e de estudo também. Devemos realizar leituras e análises, avaliar a estratégia de funcionamento dos sistemas e encontrar a causa e a solução dos problemas.
Vamos então começar com o nosso analisador de gases, muitas oficinas possuem, porém acreditamos que sirva apenas para avaliar o carro antes da inspeção veicular. Na verdade podemos e devemos utilizar o analisador de gases como: ferramenta de vendas de serviço; ferramenta de análise de motores; ferramenta de aprendizado; ferramenta de diagnóstico e ferramenta de Merchandising.
VENDAS DE SERVIÇO:
Dispondo do analisador de gases, quando o cliente traz o carro na sua oficina, mesmo que para uma verificação no sistema de freios, a verificação dos gases de escape pode ser realizada de maneira rápida e gratuita. Caso verifique um nível elevado de gases poluentes, ofereça uma revisão no motor, com o argumento de que os gases poluentes são resultados de queima incompleta, o que aumenta o consumo de combustível. Ex.:
No exemplo ao lado (foto 1), o nível de emissões estava correto, porém, o teste indicou um vazamento no sistema de escape, o que foi solucionado com a troca do tubo intermediário, ou seja uma venda efetuada de peça e de mão de obra.
No exemplo abaixo (foto 2), veículo com excesso de poluentes, mistura pobre, o que se confirmou com problema no bico injetor, revisão que foi aprovada pelo cliente, tendo como base uma demonstração eficaz do problema.
ANÁLISE DE MOTORES
No exemplo ao lado (foto 3), interpretando os valores, comprovou-se excesso de combustível não queimado e oxigênio, isso indica que em algum cilindro a mistura ar/combustível está entrando e saindo sem haver a combustão, o que foi confirmado no teste de compressão.
FERRAMENTA DE APRENDIZADO
Todos nós sabemos que o motor realiza a combustão utilizando um combustível e oxigênio, aprendemos que a queima é um processo químico, no qual os agentes envolvidos sofrerão uma reação e irão desagrupar e reagrupar, mas como nós podemos de fato ver isso?
Através da análise dos gases, e utilizando o aprendizado teórico e confrontá-lo na prática, no dia a dia da oficina, isso solidificará o entendimento e facilitará o diagnóstico, por consequência a solução do problema e a lucratividade da oficina.
Vamos analisar a combustão do motor (foto 4) e entender como se formam os gases analisados após a queima.
Durante a admissão, o motor aspira ar atmosférico que é composto por 78,09% de Nitrogênio, aproximadamente 20,9 % Oxigênio e 1% de outros gases. Para haver a queima ele receberá um combustível, que pode ser Álcool, Gasolina, GNV ou Diesel. Para cada tipo de combustível, existe uma relação ideal, ou seja, uma quantia de Ar X Combustível. Essa relação chamada estequiométrica foi determinada através de pesquisas.
Durante o processo de queima (combustão) existe a recombinação das moléculas do ar e do combustível, em situação ideal, a combustão na relação estequiométrica resultará na formação de dióxido de carbono (CO2) , vapor d’água (H2O) e nitrogênio (N) que são gases não prejudiciais, mas, devido ao fato que os motores não são 100% eficientes mesmo quando a mistura fornecida é estequiométrica, haverá a formação de outros gases como dióxido de carbono (CO2), monóxido de carbono (CO), óxidos de nitrogênio (NOx), hidrocarbonetos (HC) e oxigênio (O2).
Monóxido de carbono (CO), Hidrocarbonetos (H) e Óxidos de Nitrogênio (Nox) são gases que afetam a saúde e o meio ambiente, por este motivo a emissão máxima é regulamentada por leis estaduais.
Quando a mistura é "pobre", existe muito ar e pouco combustível na relação ar/combustível, e, quando a mistura é “rica” há pouco ar e muito combustível nesta relação.
COMBUSTÍVEL RELAÇÃO AR/COMBUSTÍVEL ESTEQUIOMETRIA |
|
Gasolina A |
14,7 Kg/1Kg |
Álcool (Etanol) |
9,0 Kg/1Kg |
Gasolina (26% de etanol) |
13,3 Kg/1Kg |
Diesel |
15,2 Kg/1Kg |
Metanol |
6,4 Kg/1Kg |
Propano |
15,6 Kg/1Kg |
Butano |
15,4 Kg/1Kg |
Metano |
17,2 Kg/1Kg |
GLP |
15,5 Kg/1Kg |
Monóxido de carbono |
2,5 Kg/1Kg |
Querosene |
14,5 Kg/1Kg |
Hidrogênio |
34,0 Kg/1Kg |
Éter |
7,7 Kg/1Kg |
GMV (Gás Veicular) |
16,6 Kg/1Kg |
Óxidos de Nitrogênio (Nox): o Nitrogênio entra e sai da câmara de combustão sem interferir no processo, porém em algumas situações de temperatura elevada acima de 1400 º C, causadas por carga elevada ou mistura pobre, haverá a combinação do Nitrogênio com o Oxigênio, formando Óxido Nítrico (NO) e Dióxido de Nitrogênio (NO2). Esses gases geralmente não são medidos no analisador por dependerem de situações específicas para sua formação, desta forma o teste seria com o motor sob carga em trânsito ou num dinamômetro. Sua formação não afeta o desempenho do motor, mas os mecanismos que evitam sua formação, como válvula EGR, se não estiverem funcionando perfeitamente elevam o nível de HC e CO.
Hidrocarbonetos (HC): são compostos resultantes da combinação de carbono e hidrogênio, sua presença nos gases de escape é resultado de vapores de gasolina não queimada e é medida em ppm (partes por milhão). Como a combustão nunca é perfeita haverá HC nos gases de escape, porém se a mistura for rica com excesso de combustível e pouco ar, ou se for pobre, dificultando a combustão, seus níveis serão elevados. Problemas no sistema de ventilação do tanque (cânister) e sistema de ignição aumentam sua presença nos gases de escape.
Monóxido de Carbono (CO): é um subproduto resultante da combustão com falta de ar, ou seja mistura rica, quanto mais rica a mistura, maior sua concentração nos gases de escape.
O monóxido de carbono não têm cor, nem sabor, nem cheiro, mas ele é altamente fatal, por isso nunca funcione motores de automóveis em locais sem ventilação, ele pode levar à morte em questão de minutos.
Dióxido de Carbono (CO2): é um ótimo indicador da eficiência da combustão, pois seu índice diminui com mistura rica ou pobre. Na descarga o seu teor Ideal é da ordem de 14 a 15% para a gasolina e na ordem de 13 a 14% para o álcool, e em torno de 12% para o GNV, ou seja, varia com o tipo de combustível usado e é influenciado pela relação hidrogênio/carbono deste. Também oferece informações sobre a integridade do sistema de escapamento.
Oxigênio (O2): Sempre haverá oxigênio no escapamento, porém quanto menor sua concentração será um indicativo da boa queima, se a mistura estiver pobre ou houver furos no sistema de escape sua concentração aumentará. A presença de níveis elevados de oxigênio e hidrocarboneto indica falhas na combustão, como por exemplo um cilindro com falha na ignição ou na compressão.
Relação da mistura estequiométrica e gases do escape:
O nível de HC é menor quando a mistura é ideal, devido ao fato de que quase todo o combustível é queimado. Misturas mais pobres ou mais ricas ou ainda falhas de ignição causam aumento do teor de HC, devido à combustão incompleta.
Os níveis de CO são mais baixos quando a relação ar/combustível está próxima da ideal devido à menor sobra de carbono e oxigênio resultantes de uma combustão mais completa.
Misturas ricas causam o aumento do nível de CO, sendo que, partindo da mistura ideal para misturas mais pobres, o efeito é mínimo.
Os níveis de CO2 são mais elevados quando a relação ar/combustível estiver próxima da ideal e diminuem quando a mistura se torna rica ou pobre.
Os níveis de O2 são próximos de zero quando a relação ar/combustível for ideal, devido ao fato de que a maioria do oxigênio é consumida durante a combustão. O teor de O2 nos gases de descarga se mantém baixo quando a mistura enriquece, e aumenta quando a mistura é pobre.
Além da interpretação dos gases e aprendizado da forma de trabalho do motor, também podemos avaliar outras situações. O programa do analisador de gases permite que seja feita verificação oficial, verificação com medições da rpm e temperatura do óleo do motor. Veja as imagem seguinte:
Nesta imagem (foto 5) observe a temperatura do óleo lubrificante. Esta imagem é de um Gol 1.0 ano 2005.
Agora com outro Gol 1.0 ano 95 (foto 6).
Na imagem acima, o eletroventilador já havia acionado cerca de três vezes, o que demonstra que o motor estava aquecido na temperatura normal de trabalho. Podemos observar uma infiltração de ar no escape e também a diferença de temperatura do óleo lubrificante. Isto mostra o porquê da necessidade de utilizar lubrificantes com qualidade e especificações corretas, pois com a evolução dos motores, aumentou a temperatura de trabalho do lubrificante.
Na utilização do analisador de gases, podemos de maneira opcional fazer a leitura de rpm e temperatura do óleo, podemos fazer uma leitura simples ou completa, também podemos avaliar na forma de gráficos conforme imagens abaixo.
LEITURA COMPLETA
Na leitura completa (foto 7), podemos avaliar a relação lambda e a relação estequiométrica ou A/F do motor, muito útil para diagnósticos nos veículos flex, para avaliar mudanças no combustível.
Leitura Completa sem RPM e Temperatura do óleo (foto 8).
Leitura no Modo Contínuo Simples (foto 9).
Leitura no modo de Gráficos (foto 10).
Leitura Simples com valores Individuais, para análise de apenas 01 elemento, na forma numérica (foto 11).
E na forma gráfica (foto 12).
FERRAMENTA DE DIAGNÓSTICO
O analisador de gases é útil para uma série de diagnósticos, que vão muito além da simples verificação do veículo para um teste de inspeção veicular. Por exemplo:
• Medir a eficiência do motor, identificando consumo excessivo de combustível e ajudando a localizar as causas.
• Identificar a Relação Ar X Combustível em motores Flex.
• Identificar problemas da parte elétrica, mecânica e alimentação de combustível.
• Identificar problemas no sistema PCV.
• Realizar testes na válvula do cânister.
• Identificar vazamento de vapores de combustível, pela tampa, módulo de combustível, mangueiras.
• Verificar a presença de gases da combustão no sistema de arrefecimento, o que indica problemas na junta ou no cabeçote.
• Identificar entradas falsas de ar, que causam falhas em acelerações.
• Testar a qualidade e o nível de contaminação do óleo lubrificante.
• Testar a presença de combustível em motores que não querem funcionar.
• Identificar vazamentos no escapamento (oportunidade para venda).
• Testar a eficiência do Catalisador (oportunidade para venda).
Por suas utilidades o analisador de gases pode comprovar a relação estequiométrica sem uso do scanner, muito útil em motores flex. Também pode esclarecer para os clientes que acreditam que o carro está com consumo de combustível acima do normal, sendo possível de forma precisa verificar a qualidade da queima, se estiver dentro dos valores corretos indica que o motor está sendo eficiente e que a busca pela economia deverá ser feita repassando outros pontos, com calibragem de pneus, uso de lubrificantes e maneira de dirigir.
Verificando Relação A/F (foto 13).
Avaliando Consumo de combustível (foto 14).
FERRAMENTA DE MERCHANDISING
O cliente é observador (foto 15), quando ele é atendido na oficina, verifica sua limpeza, organização, a presença e utilização de equipamentos de diagnósticos, o nível de conhecimento e metodologia de trabalho da oficina. Isso cria uma ótima imagem e uma confiança que o inspira a manter seu veículo realizando as manutenções na sua oficina. Cada cliente satisfeito, e que tenha essa imagem positiva em mente será um aliado na divulgação da sua oficina, do seu trabalho e com certeza novos clientes virão por indicação.
CONCLUSÃO
As oficinas que possuem analisador de gases devem fazer a revisão dos mesmos e utilizá-los de maneira efetiva, pois é um investimento de alto valor e um equipamento de precisão que não deve ser ignorado, ao contrário, podemos e devemos explorar suas funcionalidades para tornar a oficina um local mais eficiente na venda de serviços, no diagnóstico e na solução dos problemas. Quem não possui um analisador de gases, é um ótimo momento, pois todo conhecimento demanda um período para entendimento e assimilação. Com a evolução dos motores, as discrepâncias entre um com bom desempenho e outro com baixo desempenho será mínima, cada vez mais sutis, o que exigirá conhecimento e equipamentos dedicados para uma melhor e correta análise e interpretação das informações obtidas. Talvez no futuro a inspeção veicular seja retomada, o que irá demandar conhecimento e prática, quem possuir terá uma vantagem, mas mesmo que isso não venha acontecer, vamos fazer valer nosso investimento hoje, na melhoria do serviço, do nível de conhecimento e também é claro ajudando a diminuir os níveis de poluição, o que será benéfico a todos.